14/06/2010
Do El País
O Google é a principal porta de entrada da internet. Sua ferramenta de busca é usada por seis em cada dez internautas no mundo (nove em cada dez na Espanha). Mas o Google não quer somente reinar na tela dos computadores. Quer estender seu domínio as outras telas. Para aparelhos móveis, lançou seu sistema operacional Android — que controla todos os aplicativos dos aparelhos — e conquistou, em apenas um ano e meio, a confiança dos fabricantes de celulares e smartphones, ganhando espaço do Windows da Microsoft e do Symbian da Nokia. O Android também começa a equipar netbooks e tablets dos principais fabricantes de informática. Só faltava ao Google ocupar a tela da televisão. E a empresa anunciou que está disposta a tentar.
Até agora, a Google TV é somente um anúncio realizado pelo conselheiro da Google, Eric Schmitd, depois de assinar um acordo com a Sony, a Intel e a Logitech para desenvolver o projeto. Mas pode mudar o cenário da televisão, deixando sem sentido coisas como senhas de acesso, cotas de tela ou medidas de audiência. E, ainda mais importante, pode realizar uma reviravolta radical no modelo de financiamento de cadeias de tevê e suas fontes publicitárias. O Google News fez isso com o jornalismo impresso, em uma mais que difícil convivência com as empresas de comunicação, que acusam o Google de parasitismo, por usar seus conteúdos indiscriminadamente a fim de vender seu próprio serviço de publicidade.
O que pretende o Google TV? De acordo com o vídeo explicativo divulgado pela empresa, o espectador vai sentar-se em seu sofá e, ao ligar a televisão, dar de cara com uma ferramenta de busca que lhe permitirá escolher o programa ou filme que pretende assistir. A ferramenta, da mesma maneira que na internet, vai apresentar os resultados armazenados nas webs das cadeias de tevê, produtoras e demais provedores de todo o mundo que aportarem seus conteúdos. O usuário só vai ter que escolher, clicar e ver seu programa favorito quando melhor lhe parecer, programando sua exibição ou gravando uma cópia.
O Google afirma que não há porque existir conflito com as tevês, porque elas é quem vão decidir quais conteúdos estarão disponíveis e se serão gratuitos ou pagos. Mas essa neutralidade é questionada por muitos. Para começar, se o Google for bem sucedido, as plataformas que oferecen programação de tevê pelo protocolo da internet (IPTV) em banda larga, como a Imagenio, teriam seu negócio estrangulado. Mas a mudança mais importante seria tirar as cadeias convercionais do controle da tevê na web, ainda embrionária, mas que será fundamental em um futuro bem próximo, ao permitir que o Google coloque links para seus programas e leve de quebrada uma fatia da torta publicitária, hoje totalmente controlada por elas.
A internet está cada vez mais presente em nossas vidas, tomando o lugar da televisão. E o uso dos aparelhos móveis inteligentes (smartphones), que permitem a navegação na rede, aumentou ainda mais esse domínio.
Na Espanha, por exemplo, a internet já supera a tevê como mídia mais assistida. O último estudo da Mediascope Europe mostra que os espanhóis passam 13,3 horas por semana navegando na internet, comparadas a 13 horas que dedicam à televisão. Essa distância cresce conforme decresce a idade da população pesquisada.
O Google sabe que não é possíve deter a internet e deseja integrá-la de uma vez por todas à televisão. Para isso usará seu software Android que, diferente de outros, como o Windows da Microsoft ou os usados pela Apple, tanto em seus PCs quanto em seus aparelhos móveis, é aberto, gratuito e permite desenvolver todo tipo de aplicação. Essa característica faz dele uma arma temida entre os celulares. Em 2009, o Android multiplicou por seis sua participação no mercado de smartphones. E os novos modelos de miniportáteis e tablets, desenvolvidos especificamente para a internet, estão incorporando o Android.
Para que o Google TV seja um sucesso é necessária a adesão dos fabricantes de aparelhos de tevê ao projeto. Até o momento o único é a Sony, mas a empresa está confiante de que vai conquistar os demais. E haverá sempre a possibilidade de comprar descodificador que permita ver o Google TV em qualquer televisor.
O projeto suscita dúvidas. O usuário resiste a empilhar mais caixas ao redor de sua tevê ou comprar um aparelho novo, a menos que receba um benefício palpável: ver de graça ou a preço muito acessível seus programas favoritos em streaming. O streaming – que possibilita assistir vídeos ou ouvir músicas sem precisar baixá-los – está se tornando cada vez mais comum. A web musical Spotify ou a de vídeos seriesyonquis.es são boas mostras desse sucesso. Mas isso é a ruína para os proprietários de conteúdo. Spotify, que funciona com acordos com as gravadoras, teve que restringir seu acesso por exigência dos selos musicais. Da web de vídeos, que sobre para a internet, sem permissão, links de conteúdos, não recebem nada, e algumas cadeias tiveram que mudar os horários de suas séries de maior audiência porque muitos internautas já haviam assistido os episódios por meio dessas páginas.
No Google TV ninguém garante que, terminada a promoção, o espectador não vai usar a feraemnta de busca como uma página de links para chegar a seus programas favoritos a custo zero. Por que, por exemplo, pagar por uma partida da Liga quando se pode captá-la em uma tevê da Ásia que a transmite no canal aberto?
A televisão é o meio que recebe a maior parcela das verbas publicitárias na Europa (representa 42% do total). Em 2009, recebeu Eu 2,37 bilhões, uma queda de 23,1% em relação ao ano anteior. A internet é o terceiro meio preferido pelos anunciantes (11,6% do total), mas não foi, no último ano, o único segmento que cresceu (+4,96%), de acordo com os dados de especialistas em publicidade IAB e Infoadex. A torta é apetitosa demais para que o Google resista à tentação de uma mordida. Mesmo que não tenha, ainda, combinado com as cadeias de tevê como vai dividir esta torta, é melhor que elas comecem a afiar suas facas.