Antena Coletiva – TV digital chega no final de 2007

A TV digital brasileira adotou o padrão japonês, como queriam os radiodifusores, descartou a multiprogramação, importante para a democratização da comunicação, mas vai ter quatro canais públicos, o que é uma boa notícia.


A TV digital brasileira adotou o
padrão japonês, como queriam os radiodifusores, descartou a
multiprogramação, importante para a democratização da comunicação, mas
vai ter quatro canais públicos, o que é uma boa notícia.

Lia Ribeiro Dias

Outdoors nas rodovias da Itália

avisam a chegada da TV digital

terrestre
No último trimestre de 2007, devem chegar ao mercado os primeiros
televisores digitais e as caixas que fazem a conversão do sinal digital
para o analógico, para serem acopladas aos televisores convencionais,
esses que os brasileiros têm em casa. Quem adquirir um desses dois
aparelhos, e morar nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro (onde as
emissoras já estão equipadas), poderá, então, receber o sinal da TV
digital. Qual a vantagem? Nos televisores digitais, a imagem é de
cinema. Nos analógicos integrados ao conversor de sinal, tem a
qualidade de um DVD. Acabam os chuviscos e fantasmas.

A TV digital começou a se tornar realidade no país no dia 29 de junho,
quando o presidente Lula assinou o decreto que cria o Sistema
Brasileiro de TV Digital Terrestre, o SBTVD-T. O decreto define os
critérios para a implantação da TV digital (veja o quadro), estabelece
a adoção do padrão de sinais do japonês ISDB, e um prazo de dez anos
para a migração do sistema analógico para o digital. Durante esse
período, as emissoras transmitirão a programação nos dois formatos.

Mas a TV digital é só isso? Não. Mais do que uma imagem de boa
qualidade, ela tem atributos que não estão na TV analógica, como a
interatividade. Por meio do chamado canal de retorno, que pode ser um
telefone fixo, o celular, a internet ou um dispositivo sem fio, o
telespectador pode participar de votações, responder a enquetes, fazer

compras, e ter acesso a uma série de serviços de governo eletrônico,
por exemplo. O uso do canal de retorno, contudo, será tarifado.

Outra grande inovação é a possibilidade de colocar, na mesma faixa de
espectro, mais canais. Hoje, cada emissora de TV ocupa 6 MHz de faixa
de freqüência, onde só pode ser transmitido um canal. Na tecnologia
digital, cada emissora em funcionamento vai receber os mesmos 6 MHz,
que podem transmitir, no mínimo, quatro canais — o que, teoricamente,
amplia a oferta de conteúdo e abre espaço para as produções
alternativas, universitárias e comunitárias.

Só que o modelo digital definido pelo Brasil não estabelece a
multiprogramação para as TV comerciais. E a Rede Globo e o SBT já
anunciaram que não vão fazer multiprogramação. Vão transmitir, na
digital, só um canal, privilegiando o formato em alta definição, que
ocupa todos os 6 MHz do espectro, e a transmissão para receptores
móveis, basicamente celulares. Segundo Roberto Franco, diretor do SBT,
não é economicamente viável para as emissoras de TV, cujo modelo está
baseado na gratuidade da transmissão e na sua sustentação econômica
pela publicidade, fazer mais do que uma programação digital. Para ele,
países que optaram pela multiprogramação não são exemplo para o Brasil,
porque essa opção prevê a convivência de canais gratuitos e pagos, o
que não é permitido pela legislação brasileira.

A única possibilidade de multiprogramação está nas emissoras
educativas, que poderão transmitir programações simultâneas ou abrir
canais para o uso de terceiros; e nos quatro canais públicos criados
pelo decreto. Um do Poder Executivo; outro de Educação (ensino a
distância de alunos e professores, entre outras aplicações); um Canal
de Cultura; e um Canal de Cidadania, para programações locais das
comunidades e dos poderes públicos federal, estadual e municipal.

Reação contrária

A escolha do padrão japonês, que deverá incorporar desenvolvimentos nacionais na área de software
(feitos dentro do programa do SBTVD), provocou críticas dos
representantes do outros dois padrões que estavam na disputa – o DVD
europeu, adotado em 99 países, e o americano ATSC, em quatro. Também
reagiram as entidades reunidas na Frente Nacional por um Sistema
Democrático de Rádio e TV, que pediram, sem sucesso, o adiamento da
decisão para depois das eleições. Elas criticam a condução do processo,
pelo alijamento do Conselho Consultivo do SBTVD da discussão, pela
definição do padrão antes da discussão de um marco regulatório e do
modelo de negócios. Em nota, divulgada na véspera do anúncio oficial da
escolha do padrão japonês, acusam o governo de se submeter aos
interesses dos radiodifusores e de, a exemplos dos anteriores, seguir
tratando “a radiodifusão exclusivamente como moeda de troca política”.
E dizem que a escolha do padrão japonês “significa a morte do SBTVD”.

Muitas das críticas da Frente são procedentes, mas a opção pelo padrão
japonês pode não significar a morte do SBTVD, se a ele forem 
incorporados os desenvolvimentos brasileiros, como o middleware, camada de software
que roda em cima do sistema operacional, que deverá ser o Linux; e o
sistema de compressão de sinais MPEG4. A incorporação das inovações
tecnológicas vai ser aprovada pelo Comitê de Desenvolvimento, integrado
por vários ministros, e, segundo  pesquisadores envolvidos, vai
demandar muito trabalho, até chegar ao mercado.

O que diz o decreto


1 O governo tem 60 dias, a partir da assinatura do decreto, para estabelecer o cronograma de distribuição dos canais digitais.


2 A
implantação da TV digital começará pelas emissoras das capitais dos
Estados e do Distrito Federal, seguindo-se as geradoras situadas nos
demais municípios.


3 A implantação das retransmissoras digitais nas capitais e nos demais municípios virá na terceira e na quarta etapas.


4 A fase de implantação deve consumir sete anos.


5 Todas as
emissoras em operação receberão uma faixa adicional de freqüência de 6
MHz para transmitir programação digital. Os canais serão distribuídos
gratuitamente. O governo entende que a transmissão digital é apenas uma
evolução tecnológica do serviço que elas já prestam.


6 Durante
dez anos (prazo máximo estipulado no decreto), a programação será
transmitida simultaneamente nos sistemas analógico e digital.


7 O período de transição acabará quando a população tiver substituído os televisores analógicos por televisores digitais.


8 Nesse
momento, ocorrerá o chamado “apagão analógico”, e as emissoras terão de
devolver à União os canais (também de 6 MHz) usados para a transmissão
analógica.


9 Os
contratos de concessão serão modificados, porque o objeto da concessão
passa a ser o canal digital. A partir da assinatura do contrato, as TVs
terão 60 dias para apresentar ao governo seu projeto de instalação.


10 As emissoras terão 18 meses para iniciar a transmissão digital, a partir do momento em que o governo aprovar os projetos.