Banda larga: temor da estatal faz Oi se mexer.

A Oi fez uma proposta ao governo para contribuir com o Plano Nacional de Banda Larga. A participação das concessionárias é fundamental, mas sem regulação dos preços de transmissão - que elas combatem - não haverá competição em muitos locais. E o preço da banda larga não cairá.

12/04/2010 – (Do Tele.Síntese) O movimento da Oi na semana passada, quando seu presidente, Luiz Eduardo Falco, se reuniu com os ministros da Casa Civil, Erenice Guerra, e do Planejamento, Paulo Bernardo, para apresentar uma proposta de participação da empresa no Plano Nacional de Banda Larga já era esperado.

Apesar de as concessionárias questionarem como o governo poderá universalizar a banda larga com um backbone de apenas 31 mil quilômetros (fibras que eram da Eletronet mais as das estatais de energia elétrica e da Petrobras), menor que o da Telefônica e quase seis vezes inferior ao da Oi, a criação de uma estatal da banda larga as assusta. Temem perder lentamente a hegemonia na oferta de banda larga, serviço fundamental para a preservação de suas empresas. Temem também que o Estado adote, para a estatal, regras não isonômicas às das concessionárias. E, por fim, temem a concorrência na ponta de médias e pequenas operadoras e mesmo de estatais estaduais e municipais, a partir da capacidade de rede oferecida por essa estatal a preços competitivos o que fará cair o preço do serviço para residências e empresas.

Embora ainda não participem oficialmente da discussão do PNBL – o que só aconteceria, pela proposta do governo, após a aprovação das diretrizes básicas –, as concessionárias de telefonia fixa, donas da rede de telecomunicações mais capilarizada do país, sempre souberam que não haverá universalização sem elas. No entanto, reclamam com razão da condução do processo pelo governo que, sem consenso interno, emitiu sinais contraditórios, com porta-vozes declarando que o plano poderia ser implantado sem as teles. Mais do que exagero porque mesmo que o governo quisesse, e tivesse recursos para tanto, não tem como desenvolver um plano de banda larga prescindindo da rede de telefonia.

Mesmo que o governo venha a optar por prestar diretamente serviços à população onde ele não for ofertado a preços capazes de serem suportados pelo menos pela classe C e parte da D, não poderia abrir mão da colaboração das concessionárias. Afinal, os técnicos do governo, em suas muitas exposições, mostraram que o backbone estatal não vai cobrir todo o território nacional – perto de mil municípios ficam fora de seu raio de alcance.

Como está presente em todo o país, à exceção de São Paulo onde só oferece telefonia móvel, a Oi certamente é ator fundamental na universalização da banda larga. Até porque, nos municípios onde a estatal da banda larga (se for mesmo criada) não vai chegar, ela tem rede e terá ponto de presença de internet até o final do ano.

Portanto, ao tomar a iniciativa de apresentar uma proposta inclusive com valores de serviço semelhantes ao que pretende o governo – entre R$ 15,00 e R$ 35,00 –, desde que com acesso a recursos de fundos setoriais e desonerações fiscais, a Oi não só quer ter presença importante no PNBL. Quer também neutralizar a iniciativa de implantação de uma estatal da banda larga, seja ela a Telebrás ou qualquer outro veículo. 

A proposta da Oi mostra também que os movimentos do governo em direção à construção de um plano de banda larga já foram capazes de levar as concessionárias a trabalhar com um outro patamar de preços, mesmo que com desoneração fiscal e recursos de fundos. À exceção das capitais, onde cobra R$ 49,90 por acesso de 1 Mbps, o preço da banda larga da Oi para essa velocidade é de R$ 109,90, que somado ao valor da assinatura básica da telefonia fixa chega a R$ 150,00. Mesmo sem os impostos que incidem sobre o serviço (43% nas contas da Telebrasil), chegamos a R$ 85,00. Um valor muito distante da proposta de R$ 15,00 a R$ 35,00, mesmo com apoio de recursos de fundos setoriais.

Isso mostra que tem razão Rogério Santanna, secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, um dos integrantes do grupo técnico do PNBL, quando diz que as concessionárias só reagem quando a Esplanada se mexe. Fora disso continuam na zona de conforto de seu Poder de Mercado Significativo (PMS).

Nada disso tira o mérito da proposta apresentada pela Oi, de ela ter saído da zona de conforto para ser pró-ativa, reivindicando sua condição de empresa nacional e de ter como sócios controladores minoritários (49%) o BNDES e os fundos de pensão estatais. A questão a ser avaliada agora pelo governo, dividido nessa questão que não é acessória, é se o PNBL pode ser construído só com a ação das concessionárias, em particular da Oi, e demais prestadoras de serviço.

Apesar de ter inúmeros defensores não só na iniciativa privada, essa tese oferece riscos elevados. Senão vejamos. Recentemente, como revelou, na semana passada, a jornalista Miriam Aquino na newsletter Tele.Síntese Análise, a Abrafix, que representa as concessionárias, entrou na Justiça contra regulamento da Anatel que disciplina o Plano Nacional de Metas de Universalização, resultado da troca de obrigações das concessionárias de construção de Postos de Serviços de Telecomunicações por backhaul, que até o final do ano levará a banda larga a todas as sedes dos municípios brasileiros. A Abrafix questiona o fato de a Anatel querer tarifar o preço do backhaul, alegando que ele é um serviço privado, embora seja bem reversível à União. Ora, a motivação do Estado ao propor a troca de obrigações foi não só fazer o backhaul chegar a todas as sedes municipais, mas oferecer a sua capacidade a preços competitivos. Sem isso, essa dinâmica reforçaria ainda mais o monopólio da oferta de banda larga das concessionárias.

Ora, um dos motivos de a banda larga ser cara no Brasil, além da qualidade insuficiente e baixa velocidade oferecida, é o fato de que na maior parte do país não há competição. E não há competição não só porque o poder aquisitivo é baixo, mas porque os pequenos prestadores de serviços têm de comprar capacidade de infraestrutura (links) das concessionárias, capacidade que não existe ou é cara. Falco, da Oi, diz que não tem oferta porque não tem capacidade sobrando. Toda rede de transmissão que implanta, a própria concessionária consome. O mesmo dizem as demais concessionárias, como a Embratel. Esses prestadores estão espalhados pelo país, são perto de 2 mil e atendem pelo menos às cidades com mais de 20 mil habitantes.

Sem oferta de meios a preços competitivos, não haverá competição às concessionárias locais, exceto nos grandes centros, como ocorre hoje, onde atua com agressividade a Net e a GVT.  É por isso que a banda larga nas capitais é mais barata. E sem competição, os preços não caem, mesmo onde existe uma classe C forte em condições de pagar R$ 35,00 por uma banda larga.

O recurso da Abrafix à Justiça mostra que a briga para impor regulação de preços na comercialização da infraestrutura e o compartilhamento de rede será um desafio enorme a ser enfrentado pelo Executivo e pela Anatel. Todo o sucesso do PNBL depende, em grande medida, de ações nessa direção. A história da Anatel não é a história de um regulador capaz de enfrentar com sucesso as empresas dominantes. Na Europa, reguladores fortes conseguiram dobrar as empresas dominantes e impor a competição na banda larga.

Resta saber se o Brasil deve reduzir a intervenção do Estado na política de banda larga à força regulatória da Anatel para controlar o poder de PMS das concessionárias na banda larga ou se deve lançar mão também de uma estatal de banda larga que atue especialmente no atacado? Ou, ainda, se os sócios estatais da Oi não deveriam ter uma maior participação na definição de suas estratégias, em defesa dos interesses da sociedade brasileira?

Veja matéria da Convergência Digital sobre a proposta da Oi. E aqui, no Tele.Síntese, entrevista com Luiz Eduardo Falco, presidente da operadora.em que ele defende a ideia de que a Oi deve ser o veículo para implementar as políticas do governo.