opinião

Provedor comunitário: uma demanda urgente

Marcelo Saldanha
 

ARede nº 81 – junho de 2012
 

DESDE QUE a internet passou a ser disseminada de forma comercial no Brasil, em 1995, temos visto o impacto desse serviço na vida das pessoas e, em paralelo, o desenvolvimento dessa tecnologia em prol de interesses econômicos. A exploração da internet como produto de consumo se amplificou ainda mais com as privatizações das telecomunicações, em 1998.

Mas o tempo passa e as águas da mudança por mais democracia e justiça social também se ampliam, culminando em manifestações globais por maior participação popular nos governos. Junto a essa demanda crescente surgem as políticas públicas de inclusão digital e banda larga no Brasil, apesar de serem montadas antes das explosões das redes sociais e das novas mídias. Entre essas iniciativas, uma, em especial, ainda necessita de regulação, apesar de o texto da lei já dar brechas para seu pleno funcionamento: o serviço de provedor comunitário de acesso à internet.

Trata-se de um novo modelo de acesso, com caráter exclusivamente social e sem fins lucrativos. Com gestão feita pela sociedade, mais especificamente pelos associados que integram o provedor. Isso significa que todas as tomadas de decisão são definidas em plenário ou efetivamente delegadas para um gestor local, que pode ser, por exemplo, uma associação de moradores.

Segundo as últimas informações oficiais sobre o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL), somos 70 milhões de brasileiros (as) com acesso à internet banda larga. Para a União Internacional de Telecomunicações (UIT), o conceito de banda larga se define a uma velocidade acima de 1,5 Mbps. Mas, nos dados do PNBL, estão contidos os acessos 2G, 3G e os pacotes populares de 1 Mbps nominal (com velocidades abaixo de 1 Mbps). Esses serviços, prestados por empresas privadas, custam pelo menos três vezes mais que os serviços comunitários de banda larga. Além de ter a qualidade comprometida, pois as empresas podem imputar franquias de tráfego de dados com redução de velocidade (50 kbps, menor que acesso via linha discada) e só garantem 10% da banda contratada.

Ao contrário do modelo de provedores privados, em que o objetivo é o lucro, e as decisões são em prol dos interesses privados, no modelo comunitário o objetivo é o desenvolvimento social, e as decisões são democráticas em prol do coletivo.

Hoje, no Brasil, já existem provedores sem fins lucrativos e com premissas de gestão popular. Em Campos dos Goytacazes (RJ), são seis; no Rio Grande de Sul, a rede Marista montou infraestrutura de distribuição de sinal Wi-Fi e aguarda somente a Anatel deliberar sobre o novo regulamento; no Ceará, ONGs distribuem sinal para ações de inclusão digital.

Em breve, teremos debates, junto ao governo federal, para transformar telecentros e rádios comunitárias em provedores sem fins lucrativos. Todos clamam por uma internet livre, de qualidade, com preços justos e de acesso universal. Mas, para isso, esse direito humano fundamental precisa virar política pública legítima. O Estado precisa assumir sua responsabilidade, e a sociedade fazer seu papel de pressão sobre o governo, de forma que a lei seja cumprida e a função social da internet seja concretizada.

Marcelo Saldanha é presidente do Instituto Bem Estar Brasil, que visa a disseminação da prática de provedores e telecentros comunitários, e inclusão digital em localidades infoexcluídas

 
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