Prêmio ARede 2014 – Setor Público | Serviços aos usuários e à comunidade
Articulação política? Coisa de hackers!
Da Câmara dos Deputados, o labhacker gera aplicativos, ferramentas e atua para promover o debate e a formulação de políticas públicas.
Texto Fatima Fonseca | Foto Divulgação
ARede nº 101 – especial novembro de 2014
HÁ ATIVIDADES hackers na Câmara dos Deputados. Não para vasculhar as comunicações dos parlamentares, mas para formar uma rede colaborativa de desenvolvimento de aplicativos e ferramentas – em softwares livres – destinados a melhorar a interação da sociedade com seus representantes no poder legislativo. Esse é o propósito do Laboratório Hacker, vencedor do Prêmio ARede 2014. “Aqui no Labhacker temos a possibilidade de criar uma nova forma de trabalhar, de colocar o ator político, o deputado; os burocratas e qualquer cidadão, não só hacker, para discutir e repensar o parlamento”, explica Cristiano Ferri, coordenador do laboratório, criado em 2013.
A ideia surgiu durante a Maratona Hacker (hackathon), realizada em outubro de 2013 no Legislativo, por sugestão de um dos participantes, Pedro Markun, que é um dos líderes do movimento hacker no Brasil voltado à transparência. “Fizemos um grande esforço para colocar o presidente (deputado Henrique Alves) em contato direto com os hackers. E o Markun sugeriu ao presidente a criação do espaço hacker na Câmara”, relembra Ferri.
No hackerspace, que começou a funcionar de forma mais híbrida e evoluiu para o Laboratório Hacker, está em fase final de implementação um painel social que dá aos parlamentares um termômetro do que a sociedade está discutindo nas redes sociais, em determinado dia, sobre políticas públicas. Também são realizados eventos chamando pessoas para discutir na Câmara temas relacionados à transparência de dados.
Para novembro, estava sendo organizado um novo hackathon com foco na questão de gêneros. “Vamos discutir a construção de ferramentas para acompanhar a eficácia das politicas pró-gênero no Executivo”, antecipou Ferri. Doutor em ciência política e sociologia, e mestre em políticas públicas, além de pesquisador associado do Ash Center for Democratic Governance and Innovation da Universidade de Harvard, Ferri idealizou, anteriormente, o Portal e-Democracia, de participação social da Câmara dos Deputados. De janeiro a outubro de 2014, o portal teve 703 mil visitantes únicos e 31.596 cadastrados nas comunidades. Ferri é ainda gestor de projetos ligados à transparência 2.0, que trata de dados abertos, e acaba integrando diferentes atividades inter-relacionadas.
RESISTÊNCIA
O coordenador do Laboratório Hacker conta que no início houve uma certa resistência, tanto dos parlamentes em abrir a Câmara para os hackers, como de uma parcela da comunidade. “Mas o desafio maior foi na burocracia”, relata Ferri. “Um espaço hacker dentro de uma instituição pública gera uma série de discussões e questionamentos sobre a forma como a burocracia se organiza”, explica.
Superadas as dificuldades de “incluir um elemento externo da sociedade” em uma instituição pública, sobreveio o lado positivo da iniciativa: propiciar uma nova forma de trabalho às três dimensões, social, política e burocrática. Ou seja, as ações do Labhacker colocam os atores políticos (deputados), os burocratas (servidores) e todo e qualquer cidadão (não só um hacker) para discutir e repensar o parlamento.
A assistente da coordenação do Laboratório Hacker, Maria Raquel Melo, acrescenta que o espaço está aberto para a articulação de variadas politicas públicas. Por exemplo: o laboratório foi procurado por estudantes que alugam um barco e vão às comunidades ribeirinhas da Amazônia levar conhecimento de tecnologia e inclusão digital. São povoados onde, às vezes, nem luz elétrica existe. “O projeto foi para uma audiência pública na Comissão de Desenvolvimento da Amazônia. A articulação é nesse sentido. E a ideia é formar essa rede que possa apoiar esses projetos”, diz Raquel.
A equipe do Laboratório Hacker tem o apoio da academia. A Universidade de Goiás está fazendo o mapeamento do perfil de usuários do e-Democracia. “Queremos conhecer os cidadãos que participam do portal, que tipo de colaboração eles fazem”, explica Raquel. Outro convênio, com o Laboratório de estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic), da Universidade Federal do Espírito Santo, contempla a produção de relatórios e metodologias para redes sociais, buscando compreender o que pensa a sociedade em relação a políticas públicas e aos temas em debate na Câmara. Com a Universidade Federal da Bahia, a parceria inclui intercâmbio e colaboração técnica e científica especializada em redes, visando o desenvolvimento de recursos humanos.
O Labhacker tem 13 desktops, quatro laptops e quatro tablets, utilizados pelos funcionários da Câmara envolvidos com o projeto, por colaboradores e visitantes. Em quatro das máquinas roda GNU/Linux. A Casa também cedeu para o laboratório câmeras e outros equipamentos de vídeo e áudio para transmissão ao vivo dos eventos e duas TVs para apresentações, com interação por videoconferência. O ambiente tem cobertura WiFi e a divulgação de eventos é feita pelas páginas do Laboratório e do e-Democracia no Facebook, no Instagram e no Twitter. O modelo wiki é utilizado na ferramenta da wikilegis do e-Democracia, o que permite a contribuição de internautas para projetos de lei, a exemplo do que aconteceu com o Marco Civil da Internet e com o Estatuto da Juventude.
http://edemocracia.camara.gov.br/web/laboratorio-hacker