Patrícia Cornils, especial para ARede
07/11/2012 – A Câmara dos Deputados aprovou, hoje, dois projetos de lei que inserem, no Código Penal brasileiro, dispositivos para definir crimes na internet e para puni-los: o PL Azeredo (84/99), que ficou conhecido como AI-5 Digital, e o PL 2793/11, do deputado Paulo Teixeira (PT/SP). Os dois textos vão agora para a sanção presidencial. Também estava prevista para hoje a votação do Marco Civil da internet no Brasil, o PL 2126/2011, do Poder Executivo – com um novo texto, que atende o pedido do minstro das Comunicações, Paulo Bernardo, de que a a regulamentação da neutralidade de rede fique a cargo da Anatel, e não mais da presidência da República, com aconselhamento do CGI.br, como previa a versão original.
Depois de um dia de acirrados debates, que inflamaram ativistas e parlamentares, em Brasília e nas redes sociais, a votação foi adiada para a próxima terça-feira, dia 13.
No plenário da Câmara, deputados do PSDB, PSD, DEM, PP e PDT defenderam a obstrução do texto e o deputado Marco Maia (PT-RS) decidiu retirá-lo de pauta. Os ativistas favoráveis à aprovação do Marco Civil criticaram, durante a tarde, o texto apresentado pelo relator do projeto, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), em dois pontos: primeiro, os artigos 3º e 19º, que tratam da neutralidade da rede – a garantia de que não haja discriminação do tipo de tráfego que circula na rede.
A avaliação do professor Sergio Amadeu, por exemplo, é de que, ao atribuir ao Poder Executivo a função de regulamentar a neutralidade – e retirar a menção ao papel do CGI.br nessa questão –, o texto abre a porta para que as operadoras de telecomunicações estabeleçam prioridades – e impeçam inovações que firam seus interesse.
O ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, não concorda que as operadoras serão beneficiadas: “Esse é um argumento tosco, porque as teles devem estar achando que a Anatel está fazendo regras duras, mas nós temos de olhar a internet como um grande negócio que precisa ser regulado, esta é que é a verdade”. O ministro disse que a questão da neutralidade da rede foi colocada pelo governo, é um conceito consagrado, mas deve ser regulada de maneira transparente: “A Anatel deve fazer uma proposta, botar em consulta pública e deixar que todo mundo se engalfinhe democraticamente sobre isso, e depois apresentar um texto de equilíbrio”, disse.
Para Ronaldo Lemos, do Centro de Estudos de Tecnologia e Sociedade da FGV, a parte que trata de neutralidade, no texto, não é a ideal, mas é positiva. Já a responsabilização dos provedores pelo conteúdo postado em seus serviços e aplicativos (art.15 §2º) “é péssima”. O parágrafo assegura a remoção de conteúdos que violariam o copyright sem a necessidade de ordem judicial. Demi Getschko, do Comitê Gestor da Internet, tem preocupação semelhante: “Se entendi bem, além da remoção sem ordem judicial, o provedor passa a ser responsabilizado conjuntamente. Um “SOPinha”?”, tuitou ele.
Um dos dispositivos do PL de Paulo Teixeira, por exemplo, torna crime “invadir dispositivo informático alheio” com o fim de mudar ou destruir dados ou informações, instalar vulnerabilidades ou obter vantagem ilícita. A pena prevista para esse crime é de três meses a um ano de detenção e multa. Para Sergio Amadeu, isso significa, na prática, criminalizar manifestações por meio da negação de serviço – com as usadas pelo Anonymous para derrubar os sites da Visa e do Paypal em protesto contra o bloqueio de recursos doados ao Wikileaks.
O nó a ser desfeito não é simples: para a garantia de liberdades na internet, não podemos ficar sem um marco que defina direitos e apenas com leis que criminalizam práticas na rede. Mas, do jeito que está, o texto do Marco Civil pode criar janelas que prejudiquem a neutralidade na rede. E que responsabilizem provedores pela publicação de conteúdo pirata. (Com Lúcia Berbert, do Tele.Síntese)
Veja a íntegra do texto reformulado, que deveria ter sido votado hoje.