26/04/2010 – “Extremamente alarmante” é como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) classificou a situação do acesso à internet em banda larga no Brasil, em termos de preço e de oferta. O Ipea publicou hoje uma análise sobre o acesso à banda larga, com recomendações para políticas públicas que visem ampliar este acesso. No trabalho, o Ipea observa que o Brasil, apesar de se situar entre as dez maiores economias do mundo, está em 60º lugar em desempenho do setor de telecomunicações, de acordo com dados da União Internacional das Telecomunicações (UIT).
Um dos limitadores do acesso é o alto preço do serviço no país. O gasto médio com a banda larga correspondia, em 2009, a 4,58% da renda mensal per capita do brasileiro, enquanto na Rússia esse índice era de menos da metade (1,68%) e nos países desenvolvidos, de 0,5% — ou seja, quase dez vezes menor que no Brasil. “O preço relativo da banda larga no Brasil é quase cinco vezes mais alto que o preço de internet na França e dez vezes maior ao encontrado nos EUA”, diz o estudo. Resultado: “a densidade é quase cinco vezes menor que na Austrália e quatro vezes menor que nos EUA, países que mais investem em banda larga na atualidade”.
Pouca competição, preços altos.
No ritmo atual, explicam os pesquisadores, continuará aumentando a distância que separa o Brasil do grupo de economias avançadas, caso não haja interferências do Estado no mercado. Isso porque as empresas realizam seus investimentos principalmente nas metrópoles, onde se concentra a população com maior renda e o custo de instalação de infraestrutura é menor. E também porque a competição, no Brasil, é muito pequena.
Os fatores que contribuem para os preços altos são, na avaliação do Ipea, o baixo nível de competição entre os prestadores de serviço, a elevada carga tributária e a baixa renda da população. No quesito competição, o indicador de concentração de mercado (CR1) usado no estudo indica que a participação da empresa dominante em onze estados é maior do que 80%. Quando avaliado em termos municipais, esse índice mostra que, dos 2593 municípios que tinham acesso em banda larga em 2008, em somente 361 (cerca de 14%) a operadora dominante tinha um CR1 inferior a 80%. E em apenas 15 desses a participação da empresa dominante era inferior a 50%.
Por conta dessa concentração, uma das maneiras de ampliar o acesso à banda larga no país é o estímulo à competição (que, por sua vez, faria os preços baixarem), afirmam os pesquisadores que realizaram o estudo. Em um quadro que mostra as lições centrais de estratégias de outros países, o Ipea mostra que políticas regulatórias que garantam o livre acesso às redes (para que vários competidores, e não apenas um, use a infraestrutura existente), órgãos reguladores comprometidos com essas políticas de livre acesso, separação entre provedores de infraestrutura e provedores de acesso são fundamentais para ampliar o acesso à banda larga.
Velocidade limitada
O problema no Brasil não se resume à concentração de mercado e de infraestrutura, mas também é grave no que diz respeito à velocidade de conexão. Mais da metade das conexões domiciliares (54%) acessam a internet em velocidades menores que 1 Mbps, sendo que 34% ainda usam velocidade de 256 Kbps. Somente velocidades mais elevadas propiciam, por exemplo, na área educacional, ações educativas mais efetivas, como interatividade entre alunos de diversas partes do país, acesso a filmes apropriados e pesquisa a bibliografias e documentos de diversos tipos, constata o Ipea. Tanto na Austrália quanto nos Estados Unidos, os planos nacionais de banda larga consideram velocidades de 100 Mbps para os domicílios.
O governo precisa investir em uma segunda geração de internet no país, nos moldes dos projetos adotados em países desenvolvidos, e com velocidades que chegam a 1 Gbps. A conclusão, de acordo com o site Tele.Síntese, é do pesquisador do Ipea, Luis Cláudio Kubota. Segundo Kubota, “o PNBL está sendo projetado com velocidades de acesso abaixo de 1 Mbps, o que deixará o Brasil muito distante do que está sendo oferecido em outros países, inclusive aqueles com níveis de desenvolvimento semelhantes, como o México e Turquia. ‘Uma política pública não pode levar em consideração apenas a parte mais visível da infraestrutura, que é o acesso, sem deixar de acompanhar os seus futuros desdobramentos tecnológicos, sob pena de já nascer ultrapassada'”, avalia o pesquisador, em reportagem do Tele.Síntese.
Em suas considerações finais, o instituto afirma que não se pode deixar por conta da iniciativa privada o atendimento da maioria dos cidadãos. “Os governos devem liderar o caminho para a expansão da banda larga, visto que os países que a priorizaram como um serviço universal estão colhendo resultados altamente positivos”. Vários governos, inclusive, estimulam o acesso por meio de infraestrutura própria. Os pesquisadores, no entanto, alertam que não adianta priorizar a implantação de infraestrutura e deixar de lado a qualificação dos cidadãos. A internet é fundamental para o desenvolvimento de um país mas, por si só, não produz inovações tecnológicas — gera um ambiente onde essas descobertas podem acontecer. “O objetivo do processo também deve ser a inclusão cultural, informacional, educacional e profissional do maior número de brasileiros.”
Veja o estudo no site do Ipea e a cobertura do Tele.Síntese da entrevista coletiva realizada na tarde de hoje pelo instituto.