Destaque na Reatech, o formato Lida permite que leitores com deficiência visual explorem dicionários e livros de consulta.
Leandro Quintanilha
Produção artística na Reatech, em São Paulo
A criação do método Braille, em 1829, tornou a leitura acessível a
cegos do mundo todo, e grandes obras da literatura universal ganharam
versões em alto relevo. Mas o sistema de pontos salientes,
revolucionário no século 19 e até hoje importante, não é tão prático
para dicionários e livros de consulta. É preciso tatear o sumário e a
numeração das páginas até encontrar a informação desejada. Para
facilitar os estudos e o trabalho de pessoas com deficiência visual, a
Fundação Dorina Nowill (FDN) desenvolveu o formato Lida – Livro Digital
Acessível, que permite a exploração de textos digitais com áudio,
letras ampliadas e sistema de busca.
Cíntia: oportunidades de
trabalho e confraternização
O Lida foi lançado em abril, durante a Reatech — 7ª Feira Internacional
de Tecnologias em Reabilitação , Inclusão e Acessibilidade (veja o
quadro), realizada no Centro de Exposições Imigrantes, em São Paulo.
Livros convencionais são convertidos ao Lida e distribuídos
gratuitamente em CD-ROM, como explica o coordenador do projeto, Ricardo
Lemos Soares. Até o momento, a FDN já converteu 24 volumes ao formato —
o dicionário de língua portuguesa Michaelis e uma coleção jurídica, que
inclui títulos como “Direito Civil Brasileiro” e “Elementos da Teoria
Geral do Estado”. “Pretendemos converter 320 títulos até o final do
ano.”
Os interessados podem solicitar à fundação a conversão de outros
volumes, a princípio, de qualquer área do conhecimento. O tempo
necessário ao trabalho varia de acordo com o tamanho e a complexidade
da obra. “No caso de uma publicação simples, de 300 páginas, podemos
fazer tudo em um dia”, diz Ricardo. As entregas serão feitas pelo
correio. A FDN frisa que respeita os direitos autorais das obras que
converte. Os títulos são concedidos pelas próprias editoras e o
material é criptografado. Cada usuário recebe uma chave
individualizada, que precisa acionar a cada vez que consulta a obra num
computador diferente.
“Há seis níveis de navegação, entre eles ‘índice’, ‘capítulo’ e
‘parágrafo’”, detalha Ricardo. Em cada ‘página’ do livro, há um campo
para anotações e comentários, que podem ser exportados para um editor
de texto. O Lida foi concebido para ser prático e eficiente. O usuário
pode ampliar as letras ou ouvir o texto em áudio; pode também combinar
os dois recursos. Símbolos, siglas e abreviaturas são falados em seu
significado integral. O sistema também pronuncia as palavras e
expressões estrangeiras com a fonética original. E as notas de rodapé
têm acionamento opcional.
O Lida roda em computadores com as seguintes especificações mínimas:
velocidade de 700 MHz, memória RAM de 128 Mb, Windows 98 SE, CD-ROM 32x
e, claro, a máquina precisa ter placa de som. O formato funciona com o
sistema público e gratuito de voz do Windows. Para rodar no Linux, é
preciso instalar um simulador de Windows. “Fizemos testes — funciona”,
garante Ricardo, lembrando que podem ser necessários pequenos ajustes.
Produção manual
A Reatech reuniu cerca de 30 mil
pessoas
Antes chamada Fundação para o Livro dos Cegos no Brasil, a Fundação
Dorina Nowill para Cegos foi criada em 1946 pela professora que hoje
lhe dá o nome. Dorina perdeu a visão na adolescência e enfrentava
dificuldades para encontrar livros em Braille. No começo, voluntários
produziam as texturas do sistema manualmente, até que, com o apoio dos
governos municipal e estadual, a entidade pudesse adquirir uma imprensa
especializada, para produzir volumes em escala industrial.
Hoje, a FDN oferece programas e atendimento especializado ao deficiente
visual ou cego, e sua família, que incluem avaliação, diagnóstico,
intervenção precoce, educação especial, reabilitação e colocação
profissional de cegos. Em 2005, a Fundação produziu mais de 17 milhões
de páginas em Braille, além de 22 mil exemplares de livros e revista
falados. Todo o material é distribuído gratuitamente para mais de 1,3
mil entidades brasileiras.
A Robótica 2007 – Salão Internacional de Robótica e Inteligência
Artificial ocorreu quase simultaneamente à Reatech, em outra ala do
Centro de Exposições Imigrantes, em São Paulo. Mas bastava seguir pela
entrada lateral para se deparar com o que hoje é considerado o maior
evento sobre tecnologia inclusiva da América Latina, a Reatech – Feira
Internacional de Tecnologias de Reabilitação, Inclusão e
Acessibilidade. O ingresso para a Robótica custava R$ 20,00 — o da
Reatech era gratuito.
Apesar das dificuldades de divulgação, o evento recebe, todo ano, cerca
de 30 mil pessoas. A sétima edição ocorreu entre os dias 12 e 15 de
abril. A Reatech propõe-se a atender pessoas com os mais diversos tipos
de deficiência — física, mental, visual, auditiva e múltipla, com
destaque para avanços tecnológicos e futuros lançamentos. O
público-alvo também inclui profissionais da saúde, assistentes sociais
e educadores.
Entre os expositores, fabricantes de produtos para pessoas com
deficiência, empresas com vagas preferenciais abertas e entidades de
representação e apoio. Montadoras apresentaram versões adaptadas de
vários modelos automobilísticos, enquanto multinacionais como a HP e a
IBM cadastravam candidatos para seus programas de contratação de
pessoas com deficiência.
A analista de sistemas Cíntia Sena, de 30 anos, que é paraplégica,
preencheu formulários de seleção de três empresas durante a visita ao
evento. “Acho que tenho boas chances aqui”, disse. “Mas o evento não é
só prestação de serviços — é um espaço de confraternização.” O
funcionário público Roberto Rocha, de 44, também aprovou o evento. “Os
cadeirantes têm uma dificuldade maior que outros deficientes de
conseguir trabalho, porque muitas empresas não são adaptadas
arquitetonicamente.”
Dados coletados pela organização indicam que pelo menos 15% da
população brasileira têm algum tipo de deficiência. Estimativas da
Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Mundial de Saúde
(OMS) revelam que, no Brasil, mais de 500 pessoas tornam-se portadoras
de algum tipo de deficiência todos os dias.
www.reatechvirtual.com.br — Reatech: Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade
www.lida.org.br – Livro Acessível Digital (em construção)
> Para se cadastrar, entre em contato pelo e-mail lida@fundacaodorina.org.br